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Eunápolis, 01 de agosto de 2020

Querida Margareth

Permita-me chamá-la assim, pois se o faço è por tê-la em alta estima. Peço desculpa pela a ausência, pois as duas útimas semanas foram cheias de trabalho. Um trabalho estranho que ao mesmo tempo é longe, também é tão proximo que literlmente invade nossa casa que deveria ser o nosso santuário. Mas, em tempo de crise nos resta a adaptação para melhor vivência e sobrevivência. Ainda assim sou prvilegiada por todos os dias amanhecer sob um lindo sol ou chuva. Este ano o inverno está um pouco mais definido com manhãs geladas, o dia ameno e tardezinhas frias e noite geldas. O vento, ora suave e ora turbulento assovia em minha janela do quarto. Acordo e me sinto nos clássios filmes de castelos com fantasmas. Temos também o sol, que insiste em resistir, mas é vencido pela chuva, que pode vir como uma visita inesperada e que nos põe a correr para arrumar a bagunça que exatamente naquele dia não quisemos mexer. A chuva pode vir de mansinho, caindo aos pouquino e bem fininha, como uma criança que chora aquele choro fino e nem lembra mais porque chora. Porque chora Maria chorona? E a noite quando chega traz consigo o silêncio e é o momento de nos recolher não só no quarto, mas em nós mesmos, olhar para os nossos fantasmas, o nosso eu e se deixar cair no sono com sonhos que nos alegram ou nos entristecem ou assustam nos fazendo acordar com o coraçao palpitante e daí a gente acorda e fica feliz por ter sido um sonho. Sou previlegiada, pois da janela do meu quarto vejo as estrelas e o brilho que emanam delas, piscam e piscam e eu nesse embalo torno a dormir como um menino “endiabrado” que passou o dia todo aprontando todas as travessuras e agora dorme o sono dos meninos. O dia amanhece de novo, mas não é o mesmo dia, assim que eu já nãao sou a mesma de ontem, pois, como disse o filósofo “Ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”. Por isso, eu e o dia não somos os mesmos. Vamos, assim nos reconhecendo e nos refazendo todos dias.Bendito é o Deus que nos premite “trocar de pele” todos os dias e ter a oportunidade de ser melhor, o que nem sempre acontece, é claro.

Hoje o dia amanheceu chuvoso e vento anuciava que o céu cinza é do inverno. Saí cedo para o mercado e a chuva fina molhava o meu rosto mesmo protegido pela a sombrinha. As pessoas andavam apressadas e carrancudas com roupas de frio improvisadas, como alguém que recebe aquela visita não anunciada. De repente o sol aparece e é percepitível a mudança no rosto de cada um, quase um comercial de margarina. E o dia seguiu assim.

Espero que você esteja bem

Um abraço para ti e para o Aníbal

 

Se eu pudesse trincar a terra toda

E mentir-lhe um paladar,

E se a terra fosse uma coisa para trincar

Seria mais feliz um momento...

Mas eu nem sempre quero ser feliz.

É preciso ser de vez em quando infeliz

Para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol,

E a chuva, quando falta muito, pede-se.

Por isso tomo a infelicidade com a felicidade

Naturalmente, como quem não estranha

Que haja montanhas e planícies

E que haja rochedos e erva...

O que é preciso é ser-se natural e calmo

Na felicidade ou na infelicidade,

Sentir como quem olha,

Pensar como quem anda,

E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,

E que o poente é belo e é bela a noite que fica...

Assim é e assim seja...

Fernando Pessoa

 

 

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